segunda-feira, agosto 28, 2006

Paira perigo de eclosão de conflitos em Moçambique - Estudo do DFID

Não se exclui a eclosão de conflito armado de acordo com aquele Departamento britânico de ajuda ao desenvolvimento internacional

Maputo) Paira no ar o perigo para a eclosão de conflitos sociais de vária ordem no país, defende o estudo da «DFID – Departament for International Development» (uma agência britânica de ajuda ao desenvolvimento). A eclosão de um conflito armado do estilo do que acontece na Somália, Sudão, Costa do Marfim, Congo, entre outros, é uma possibilidade que o estudo avança. Segundo a tese do «DFID» todos os cenários, políticos, sociais, culturais, económicos, e outros tantos, assemelham-se em tudo, pelas suas características, ao que se passou naqueles países antes da eclosão dos respectivos conflitos armados que hoje não só ceifam muitas vidas como também constituem o modelo do fracasso das lideranças africanas nas suas políticas de governação. O clientelismo, exclusão, assimetrias regionais, corrupção e a falta de esperança pelo amanhã que afecta a maioria dos cidadãos, são os principais factores que o estudo avança como estando por detrás daquilo que designa por “crise de governação”, muita das vezes gerada pela convulsão sócio-económica em que vive a maioria da população que não faz parte das novas elites moçambicanas. As elites detêm o monopólio dos meios de aquisição de riqueza que é Poder com o qual, segundo o estudo, pilham os recursos do bem comum que é o Estado para seu benefício individual. O mais grave nisto é que essas elites predadoras conforme a fonte não produzem riqueza bastante que possa alimentar as expectativas do grosso dos cidadãos o que faz com que a maioria, nos dias que correm, viva sem nenhuma esperança de qualquer melhoria da sua vida. Cresce diariamente o exército dos “sem esperança” que é um autêntico rastilho que basta apenas alguém com intenções de tomar o poder – meio para a obtenção de riquezas – atear fogo. E tudo estoira.

Eleitores
De acordo com o estudo os principais partidos com assento parlamentar não têm conseguido mobilizar os eleitores que neles votaram no passado. Regista-se uma tendência decrescente de afluência às urnas durante os pleitos eleitorais. Maior destaque vai para os apoiantes e simpatizantes da Renamo que no seu desespero acreditam que o seu voto não altera nada devido a pouca transparência que norteia as actividades dos órgão de fiscalização eleitoral, todos eles dominados e controlados pelo partido Frelimo, a mesma formação política donde provém o pequeno grupo de cidadãos que constituem a elite, a tal que precisa manter o Poder como principal, senão a única, sua fonte actual para a obtenção de riqueza. Segundo o estudo a falta de transparência dá sempre azo para se acreditar na existência de fraudes eleitorais que de acordo com a mesma fonte acontece com a cumplicidade dos países ocidentais representados pelos chamados observadores internacionais. Em suma a própria comunidade internacional, supostamente uma alternativa de pressão para que haja justiça eleitoral é vista também como querendo a todo custo a manutenção do partido Frelimo no Poder. Dos órgãos eleitorais e demais órgãos do Estado pelo facto de serem marcadamente partidárias – pró-Frelimo – não têm credibilidade aos olhos do eleitorado, sobretudo, do apoiante da Renamo. Como consequência, de processo em processo o número de eleitores que não vai votar cresce.
Oposição Política
Segundo o estudo, a Renamo, único partido da oposição na AR (Assembleia da República) encontra-se enfraquecido. Por um lado, devido a exclusão e desarticulação protagonizada pelo seu rival, a Frelimo, em todos os sectores, desde os órgão do Estado até mesmo à chamada sociedade civil que segundo o estudo encontra-se infiltrada de “espiões” da Frelimo. Entretanto, o estudo dedica parte considerável da sua análise à liderança da Renamo. O estudo acha que a liderança da Renamo é mais um problema para a fraqueza da Renamo que é caracterizada por essencialmente girar à volta do líder, Afonso Dhlakama. Afonso Dhlakama é acusado pela fonte documental de marginalizar ou mesmo expulsar as figuras da Renamo que demonstrem qualquer espírito de independência. Ainda segundo o estudo a Frelimo aproveita-se desse facto e manipula Dhlakama com ofertas de “benesses” que não só o enfraquecem como o desacreditam perante as suas hostes.
Cultura de impunidade
O estudo considera que as populações têm a sensação de que as elites gozam de impunidade. Fora a fraude massiva que o estudo considera ter norteado o processo das privatizações que beneficiou as mesmas elites, havendo casos que até deveriam merecer tratamento judicial, várias irregularidades e actos de corrupção protagonizados por quadros seniores continuam a ocorrer, todavia, não há memória desses altos dirigentes terem sido acusados e condenados por essas práticas. O estudo constata que apesar do cenário da impunidade ser por demais evidente e do conhecimento da comunidade doadora, esta não pára de drenar fundos de ajuda ao mesmo governo liderado por essas elites. “45% do dinheiro injectado pelo Estado para tapar fraudes bancárias” no antigo BCM (Banco Comercial de Moçambique) segundo o estudo “veio dos doadores”.
Clientelismo
A fonte refere haver em Moçambique falta de separação entre o partido Frelimo e o Estado. Segundo o estudo isso acontece porque “a Constituições dá imensos poderes ao presidente da República, incluindo o controle directo da Polícia, Sistema de Justiça e das forças de segurança”. “Este poder (do presidente da República) tem sido usado para proteger apoiantes e simpatizantes da Frelimo. Também impede o desenvolvimento de instituições estatais independentes” uma vez que os detentores de cargos públicos que para eles significam a única fonte de obtenção de riquezas tudo fazem para defender os interesses de quem os nomeou. “A Frelimo funciona como “um Estado dentro do Estado”. Por outro lado o estudo refere-se a uma aparente tensão no seio da Frelimo entre os grupos filiados ao antigo presidente, Joaquim Chissano e ao actual, Armando Guebuza num cenário em que os primeiros sentem que estão a perder o Poder o que os induz, consequentemente, a imporem uma resistência silenciosa à acção do actual grupo no Poder, como contra-partida. “A lealidade neste sistema é mantida com o pagamento de favores e o Poder apenas pode ser exercido por quem possui recursos. A própria oposição política faz parte do mesmo sistema”, refere e acrescenta que tudo acontece com base em familiaridade, grupo étnico ou outras formas de segregação.
O que resta à Renamo?
Perante o quadro atrás descrito, segundo o estudo, à Renamo resta apenas o consolo da perspectiva de uma vitória eleitoral nas próximas eleições para também alcançar o Poder. Entretanto, com o andar das coisas actualmente a indicar uma consolidação do Poder pela Frelimo o que deixa muito longe a possibilidade de uma vitória eleitoral da Renamo, “será que a Renamo vai continuar a contentar-se com as actuais benesses?”, questiona o estudo e conclui: “Talvez a Renamo continue como sempre a procura de caminhos para alcançar o Poder” como o tem feito actualmente, “ou então vai recorrer ao uso de violência para isso”. Entretanto o estudo refere acreditar que apesar da violência poder vir da Renamo ser uma hipótese a ser considerada, no entanto, “as atenções devem ser mais viradas para tensões sociais – essas são as ferramentas que poderão ser usadas por qualquer um que queira tomar o Poder a força.
(João Chamusse)

Canal de Moçambique (2006-08-28)

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