segunda-feira, janeiro 29, 2007

A Zambézia de 1800 - 1840 e a escravatura

(apontamentos)
Muhipiti (ilha) e a Zambézia de 1800 – 1840
A escravatura na colónia portuguesa de Moçambique

coluna Muana - Orripa
por João Craveirinha
(analista cultural)



escravo de castigo por tentativa de fuga

Introdução

Um povo que desconhece a sua verdadeira História é um povo de alma distorcida. Será um povo à deriva como um barco sem destino empurrado pelo vento. Encalhando aqui e ali em portos de preconceitos mais tenebrosos que o levará à destruição de sua identidade cultural.
Será esta a actualidade em Moçambique?

Dentro deste pressuposto, quem disse que os “pretos” vendiam os “pretos” voluntariamente aos “brancos”? Não será de facto um plano diabolizante de distorcer a memória histórica às recentes gerações africanas? Sem dúvida são tentativas para diluir a verdade documentada, do grande Holocausto em África de 1441 a 1900. (Escravatura iniciada em 1441 pelos portugueses chefiados por Antão Gonçalves (e Nuno Tristão) da Escola de Sagres). Com os judeus bem que tentaram distorcer a história, “esses historiadores de consciência pesada”, ao focarem apenas aspectos pontuais de servilismos forçados de judeus a serviço do nazismo, contra outros judeus, na denúncia, no sipaismo e controlo até nos campos de concentração. Mas o lobby judeu é poderoso e tem a máquina cinematográfica de Hollywood com eles para perpetuar a memória colectiva condignamente. E nós os A-ana – orripa, eternos “condenados da terra”, que cinema é que temos?
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Na apresentação do Livro (do autor desta coluna) intitulado: Moçambique, Feitiços, Cobras e Lagartos – crónicas romanceadas, o Historiador Moçambicano, internacionalmente conhecido, Luís Covane, leu em 14 de Março de 2003 no Instituto Camões em Maputo:
“João Craveirinha é um investigador, escritor, amante da história e cultura moçambicanas que dispensa apresentação.” (…)” A escrita é a forma que João Craveirinha elegeu para o diálogo, sempre necessário, sobre o nosso passado, presente e perspectivas do futuro.”(…)”A história tem um papel a desempenhar na afirmação de uma sociedade e de um povo. No nosso caso, a história oferece os alicerces da Moçambicanidade.”(…)”É muito interessante a citação extraída de uma publicação colonial referente à posição de Manicusse em relação ao comércio dos escravos: “Aquele que vende seu semelhante merece com justiça ser perseguido e caçado mais do que os leopardos e leões...”. Esta declaração do 1º Imperador de Gaza ajuda a esclarecer a natureza dos poderes africanos antes da conquista colonial e permite fazer uma avaliação diferenciada dos interesses e fontes do poder. Ficamos a saber que nem todos os aristocratas africanos viam no comércio de escravos uma forma importante de acumulação de riqueza e de reforço do seu poder e prestígio. Aprendemos igualmente que a justificação dos europeus para a prática do comércio de escravos não era por razões humanitárias. Os ideólogos europeus da última fase do capital mercantil em África sustentavam que a transformação do homem em mercadoria era para salvar os cativos das infinitas guerras sangrentas que caracterizavam a África Negra. Agora ficamos a saber que era mentira! Eram os europeus que instigavam as guerras intra e inter estados, reinos e chefaturas como forma de produção de escravos.” in Luís Covane, 2003 (actual vice-ministro da Educação e Cultura de Moçambique).
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Mas, vamos ler com maior atenção ainda (ortografia no original), excertos do Relatório colonial de 1881, confidencial e insuspeito, publicado em Lisboa pelo português reinol, o Visconde da Arriaga, presidente juiz de direito, Governador – geral de Moçambique e Deputado às Cortes do Reino de Portugal, no século XIX, que dizia sobre a escravatura em Moçambique (no norte e centro):

- …”mas os régulos do sertão prestavam-se e esta mercancia sempre constrangidos (…) sendo necessário aos brancos europeus empregarem o artifício e a violência para a conseguirem”…

…”A escravatura tornou-se um delirio durante os primeiros quarenta annos d’este seculo (sec.XIX, 1800-1840), e quanto mais se desenvolvia a America, tanto mais se despovoava e empobrecia a Africa! Chegaram a navegar annualmente para o porto de Moçambique (ilha) e Quilimane á procura de pretos mais de quarenta navios de differentes nações! Em 1820, os habitantes de Quilimane, que pela sua riqueza se consideravam a povoação mais importante e aristocratica da provincia, proclamaram-se independentes desligando-se do governo da capital e unindo-se ao Rio de Janeiro”(…)

“Presidindo em Moçambique (ilha), como juiz de direito á venda em leilão de 52 pretos pertencentes á herança d’um Baneane, natural da India, causou-me horror e vergonha, quando procedendo-se em separado á d’uma preta, engommadeira, que trazia pela mão um filho de 8 annos, e outro ao colo a vi chorar lágrimas de sangue por este desprezo dos sentimentos da natureza”(...)

“Os cem prazos da corôa, que abrangem um territorio muito maior que a península ibérica”(…)”estão quasi todos abandonados, por que os seus habitantes foram vendidos para a America, e os senhores depois d’esta vergonhosa venda e ricos, seguiram quasi todos o mesmo caminho, vindo alguns para a Europa”(…)

” O Praso Luabo, que foi dos jesuitas, e que durante muitos annos forneceu mantimentos de arroz, milho, mandioca, feijão e ervilha para os navios de escravos, que aportavam a Quilimane, está hoje despovoado, por que os colonos (ex-prazeiros negros e mestiços) também foram vendidos”(…) pág. 49 do relatório confidencial do Visconde da Arriaga.

(…)” O parocho de Quilimani que havia fallecido poucos mezes antes de eu dar entrada n’aquelle porto em 1845, era o maior traficante de escravos que havia n’aquella terra; vendeu milhares de pretos! …

”mas os régulos do sertão prestavam-se e esta mercancia sempre constrangidos (…) sendo necessário aos brancos europeus empregarem o artifício e a violência para a conseguirem”… (idem pág. 7 )…

Nota: Ortografia do texto original publicado em 1881 por Lallemant Fréres,Typ. Lisboa, Fornecedores da Casa de Bragança. O Visconde da Arriaga era “Deputado Ás Cortes” do Reino de Portugal no século XIX na data da publicação deste relatório. (Esta e outra documentação histórica fidedigna não a encontrei em consulta aos arquivos da Torre do Tombo de Lisboa, visto nunca lá ter entrado). JC

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