quinta-feira, março 24, 2011

O juiz Luís Mondlane apenas confirmou hipóteses já existentes de que este governo é permeável à corrupção

 Por Gento Roque Chaleca Jr., em Bruxelas
“Os Xiconhocas estão de volta à ribalta. A vossa geração, meus queridos sobrinhos, não terá sequer uma simples pastagem (no futuro) para atenuar os duros e invisíveis golpes da miséria. Até o capim ruim que o veado não come, vós sequer tereis! E quando forem anciões (como eu, vosso tio), que de tanto mastigar no vazio a boca até anda despovoada de dentes. Não fiquem, porém, à espera que algum dia este governo compartilhe convosco o produto da esmola que recebe dos doadores, porque, como disse o músico nampulense, Salvador Maurício (antes de partir para o Reino do Senhor), os ratos roeram tudo” – Extracto da palestra com os meus sobrinhos, alargada, pela primeira vez, ao público de Bruxelas.
Há já algum tempo tenho me servindo das palestras com os meus sobrinhos para denunciar a governação desastrosa deste governo. Fá-lo porque considero estar hipotecado o futuro da juventude deste país. As comportas das políticas irresponsáveis e desastrosas deste governo não param de descarregar realidades cruéis de um país que está à beira do colapso social. De facto, como diria o velho Chaleca lá para as bandas de Chivule, em Benga, trata-se do mau começo para o futuro, porque para o presente não vejo remédio. Que não haja dúvida: o precipício já chegou…
O governo está de braços caídos face aos problemas do país. A corrupção chegou onde nunca deveria ter chegado (a Justiça). Instalou-se uma incógnita na nossa Justiça, afinal quem vai julgar a quem? Os chaúques, anibalzinhos,
zecas russos, cambazas, manhenjes, etc., cada qual ao seu estilo, invocarão segundo os decretos do reino do dolo de improducentes os crimes pelos quais foram acusados e condenados, dado que a Justiça no nosso país anda ao reboque do mal. Destarte, uma vez que o país está órfão de um governo responsável e sério, só nos resta pedir as preces da Nossa Senhora de Chivule, a ‘Padroeira Lungelina’, quem sabe, talvez haja algum milagre.
Qualquer dia vamos ter uma equipa de futebol na Cadeia da Machava e/ou na Cadeia Civil constituída por ex-governantes, uma vez que o número de acusados de corrupção não pára de subir de caudal. O mais recente caso chega-nos do Conselho Constitucional, lá onde o seu expresidente, Dr. Luís Mondlane é acusado de ter delapidado o Estado, em proveito próprio, em cerca de 36 milhões de meticais. É muito dinheiro, malumes. Com este dinheiro todo (trocado em moedas, seguramente ultrapassava a altura do acusado) dava para construir umas tantas escolas e hospitais para a população de Chivule que, desde que se anunciou publicamente a descoberta do carvão mineral, vive de promessas lunáticas, como se o estômago daquela gente recusasse guloseimas e outros aperitivos.
Poderão surgir eventualmente vozes dizendo que Chaleca Júnior é um mamífero distraído, visto que o Dr. Luís Mondlane já renunciou (pela vontade própria) o cargo de presidente do CC. Pois bem, decisão acertada. Agora pergunto, porque é que ele, juiz Luís Mondlane, no exercício das suas funções de magistrado, perante casos de réus confessos, não os soltou, tendo porém, acertadamente, mandando-os às masmorras? É que num Estado de direito não basta renunciar funções e ficar refém de uma Comissão de Inquérito que, à partida, não terá pernas para andar. Uma Justiça séria e implacável não deixaria o Dr. Luís Mondlane impune. “Ninguém está acima da lei”, disse várias vezes o actual PGR (Dr. Agusto Paulino). Acontece, porém, estamos num país em que, ao invés da lei matar a corrupção, é a corrupção que mata a lei. O Dr. Luís Mondlane quanto muito será enviado para o Comité Central da Frelimo, se a honra o deixar exercer qualquer magistratura. O contrário seria inédito, como foi inédito o seu pedido de demissão.
Veremos…
De resto, não faltou aviso à navegação ao governo do senhor presidente da República Armando Guebuza. Desde o cómico líder da Perdiz Afonso Dhlakama aos heróis de 1 e 3 de setembro, comunicaram ao PR quer através dos mídeas, quer por via de dísticos reivindicativos dessas datas, a forma como o governo está a conduzir o país. Ambos disseram que o país “está doente”. O governo limitou-se a esboçar numa folha de A4 uma série de medidas de austeridades, que nem por distracção ousa cumprir. Foi tudo uma treta mal ensaiada, porque meses depois viria à tona denúncias de corrupção ao alto nível.
Dizia o escritor dos animais (lá para as bandas de Nampula) que (cito de memória) “não se deve esconder comida debaixo da terra por muito tempo, porque as formigas farejantes acabariam por descobrir.” Para um bom entendedor, meia palavra basta! Vénia total ao escritor…
Não se pode combater à corrupção nem os corruptos com apelos (homilias). As parábolas podem até corrigir o ego dum corrupto, mas não destrói o baluarte que move a sua acção, neste caso, a corrupção. A corrupção é um vírus altamente perigoso que deve ser combatido todos os dias, sem tréguas e sem compromissos de amizade, militância, favores, etc. Como é que o combate contra a corrupção pode ser ganha se o governo nada faz para acabar com as assimetrias abismais na função pública e não só? Qual quimera improvisada para fazer adormecer os incautos!
Dada a proliferação de corruptos no governo, às vezes dou comigo a pensar se os nossos dirigentes não terão sido desmamentado (do berço ideológico) com leite contaminado pela corrução? Vem aí a vaga do “tsunami” do Norte de África que é mais forte do que qualquer corrupto. Os governos quando navegam atrás do povo, dizia um pensador contemporâneo, ficam isolados. O mesmo acontece se andarem muito adiantado do povo. Que estes exemplos sirvam de lição para os nossos governantes. Saber ouvir é uma grande virtude que pode ganhar uma batalha tida como perdida.
Gostaria de não terminar está crónica, neste dia internacional da poesia (23/03), sem apresentar ao leitor um verso do poeta cabo verdiano Aguinaldo Fonseca, um homem cujo senso estético e moral não há que pôr em dúvida.
“A culpa foi do porteiro da vida – que me indicou uma porta que não era a porta da minha vida. Tantos pedaços de mim, que destorci sem saber! Revolta, sempre revolta, por um pedaço de céu que não me dão… e era meu… Afinal este mundo é um mundo torto que nunca se endireita. É um mundo estragado cheio de ladrões de destinos e quem nasce infeliz acaba também infeliz. O mundo está estragado! O mundo está cheio de ladrões! A mim, furtaram-me a carta de recomendação que eu trazia para a Vida…” ‘Kochikuro’ (Obrigado).

O AUTARCA – 24.03.2011

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