quarta-feira, março 14, 2012

Sobre o nepotismo no aparelho de Estado (2)

Por: João Baptista André Castande

Mais grave ainda, tal como aquela sessão do IX Congresso do partido Frelimo, nem a Ministra da Função Pública nem o próprio Fórum de Gestores de Recursos Humanos foram capazes de sugerir, de forma bem clara e inequívoca, os critérios ou estratégias de combate ao nepotismo, sendo por isso que a chamada de atenção feita pela Ministra da Função Pública sobre a vigilância contra o nepotismo é totalmente inútil.


É que, na minha opinião, o próprio conceito de nepotismo no contexto moçambicano carece de aclaração. Um exemplo apenas para tornar cristalina a minha ideia: se determinado ministério abre concurso público de ingresso em que por mera coincidência candidatam-se a filha, o filho e sobrinho do titular do pelouro e estes passam com algumas das melhores classificações obtidas, amanhã poder-se-á dizer, com boa dose de razão, que aqueles candidatos foram beneficiados pelo nepotismo?

Mas como provar isso na prática, se nos avisos de abertura do concurso não estavam previamente vedados de concorrer os familiares do titular do pelouro, além de se verificar que, no exercício da sua função, o júri observou escrupulosamente os deveres estabelecidos pelo Regulamento dos Concursos aprovado pelo Diploma Ministerial n.o 61/2000, de 11 de Abril?

O exemplo acima é assaz diferente dos casos em que o ingresso e outros actos relacionados com as nomeações, promoções e contratações não tenham obedecido aos ditames constitucionais (vd. artigo 251, n.o 1 da CRM) e das leis porquanto, nestes casos concretos, a Lei é mais clara e contundente ao estabelecer que os actos assim praticados são nulos e de nenhum efeito (vd. artigos 9, n.o 3 do EGFAE e 129 da Lei n.o 14/2011).

Todavia, tenho verificado que perante a constatação dos casos acima referidos, a solução tem sido a legalização dos actos ilegais detectados, atitude “paternalista” esta que não contribui para o combate às irregularidades cometidas no processo de gestão dos recursos humanos do Estado, além da aparente indiferença do Ministério da Função Pública em relação às denúncias feitas pelos cidadãos sobre anomalias diversas.

Ora, se em direito diz-se que quem alega ou acusa é que deve provar, pode-se afirmar que a Ministra da Função Pública, ao acusar os gestores dos Recursos Humanos de serem os principais promotores de nepotismo, ela tem provas suficientes da acusação que conscientemente faz. Então, que seja ela a dar o primeiro exemplo de combate ao nepotismo, uma vez que para tal não lhe falta dispositivo legal aplicável.

Na minha modesta opinião, bastaria que com os casos provados que tem, ela a ministra removesse dos ministérios que actualmente integram todos os funcionários e agentes do Estado beneficiários do nepotismo para outros ministérios muito longe dos dirigidos pelos respectivos familiares, fazendo uso da prerrogativa que lhe confere o artigo 22 do EGFAE.

Aí sim, diríamos que a prática é o critério da verdade, contra a falácia e/ou retórica que estamos cansados de ouvir há quase trinta e sete anos consecutivos!!!

Fonte: Jornal Notícias - 14.03.2012

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