sábado, abril 11, 2015

Carta aberta ao Ministro da Educação, Jorge Ferrão

Nós, os professores, não queremos ser milionários


Por Francisco Wache

Senhor Ministro, tenho acompanhado atentamente o seu trabalho, desde que ascendeu ao cargo de Ministro de Educação e Desenvolvimento Humano. Diga-se, tem sido um trabalho, até agora, excelente. Há, de facto, necessidade de reflectirmos sobre o rumo a que a nossa Educação está a tomar. Tenho aplaudido bastante algumas conclusões a que tem chegado sobre os problemas que enfermam a Educação, daí que tenho sido o seu fã incondicional.

Na quinta-feira, dia 9 de Abril, acompanhei atentamente o seu discurso no Parlamento. E como de costume, fiquei emocionado ao ouvir que sabe falar com propriedade sobre os problemas que enfermam a nossa Educação. Mas também ouvi, com muita tristeza, a firmação de que “em nenhuma parte do mundo o professor é milionário”.


Ora, o Senhor Ministro, sendo professor, sabe que o problema do professor Moçambicano não é ter um salário milionário. Não sei por que motivos este infeliz enunciado atravessou o seu discurso, que estava a ser magnífico. É possível, é o que penso, que um dos seus assessores, mal-intencionado, é claro, tenha colocado este enunciado sem a sua anuência, porque não o vejo como um pensamento genuíno seu, mas de uma pessoa que nunca foi professor de verdade, de uma pessoa que nunca soube o que é deixar crianças em casa, para ir trabalhar, sem pão. De uma pessoa que nunca sentiu a dor de ver um homem da EDM a vir corta-lhe a energia e o da FIPAG a cortar-lhe água por não ter conseguido pagar estas despesas no tempo previsto. A pessoa que atravessou este enunciado no seu discurso não sabe a dor de um professor que vê a sua casa de adobe a cair por causa da chuva; não entende a humilhação que passa o professor ao ir a um agiota comprar dinheiro para conseguir viver com a família até ao fim do mês; nunca passou a noite sem dormir por pensar onde conseguir um dinheirozito, para levar o seu filho, enfermo, a um bom hospital, a um bom médico; não sabe o que é pedir a um aluno 50.00MT para apanhar táxi-mota, para voltar a sua casa, no dia em que a sua aula termina as 22:55 H. Enfim, a pessoa que colocou este trecho no seu discurso não nos conhece, não nos entende e devia ser demitido e ser julgado por injúria e difamação ao professor.

Senhor Ministro, nós os professores, quando falamos que o nosso salário é baixo, não queremos, com isso, dizer que queremos ser milionários. Estamos, isso sim, Senhor Ministro, a dizer que o nosso salário não nos permite ser bons educadores; o nosso salário não nos permite ter uma vida decente; não nos permite que trabalhemos tranquilos. Não pedimos o muito, estamos a pedir o suficiente. Não queremos ser milionários, Senhor Ministro; queremos, apenas, ter uma casa e alimentação condignas, queremos dar uma educação condigna aos nossos filhos, queremos conseguir pagar a água que bebemos e a energia que usamos para planificar as aulas anoite. Os que nasceram para ser milionários, que continuem a ser milionários, nós só queremos uma vida condigna, só isso.


Atentamente: Me. Francisco Mateus António Wache francisco.mateus88@yahoo.com.br

6 comentários:

Anónimo disse...

palavras sabias, uma carta bem resumida mas diz tudo

Anónimo disse...

Depois clamam pela qualidade de ensino com essas condições miseráveis senceiramente...

Anónimo disse...

Carta excelente! Compartilho! O que me incomoda ligeiramente é um parecer pedir, implorar O pagamento de um salário justo para um trabalho de tamanha responsalidade como o de educar! aquele ou aquela que contrata alguém para um trabalho de responsabilidade, e quer assumir responsabilidade pelo produto que pretende, reflecte sobre que contra-valor (salário, condições de trabalho) oferer para conseguir resultados com a qualidade desejada. Neste caso não custa, basta pegar 5mil meticais e orçamentar as necessidades na carta acima descritas e isso para um mês. Depois perguntar se ainda sobra algum dinheiro para a compra de um livro de pedagogia, de didáctica ou de qualquer ciência por ano! Como é possível ensinar o aluno a saber sem se saber muito e sobretudo sem a possibilidade de actualização permanente?

Anónimo disse...

Gove, eu certamente subscrevo por baixo nesta carta.porque é que nas escolas privadas o ensino ainda é credivel do ponto de vista de qualidade?a resposta é muito simples nas escolas privadas os professores sao melhor pagos em relacao nas escolas publicas.

Anónimo disse...

Bela observaçao , acompanhada de excelentes factos e refutaveis.

Unknown disse...

Só devia ser você meu docente Françisco Mateus António Wache. As palavras bem ditas e bem resumidas, e agora ele já vosso Reitor espero que vais lhe lembar desse discurso no dia que vai vos visitar aí na UP NAMPULA.